sábado, 23 de dezembro de 2006

A menina estava deitada em sua cama lendo. O livro a fazia viajar de volta ao lugar de onde tinha partido, mas onde ainda moravam seus sentimentos. Imaginou-o deitado em seu colo enquanto ela acariciava seus cabelos sempre desarrumados. Ele falava sem parar, coisa rara quando estavam só os dois e ele parecia se fechar numa concha. A conversa os aproximava. Ela adorava tê-lo tão perto, sabia que ali ele se permitia ficar por inteiro e se entregava as confissões mais íntimas. Alem de que em meio a um ou outro episodio ele sorria tão naturalmente e tão tranqüilo que iluminava todo o quarto. Nesses momentos ela parecia se concentrar mais e mais como se fotografasse a cena na memória, pra não esquecer... Tinha feito isso tantas vezes que agora era só fechar os olhos que o enxergava.

- Por que você me conta essas coisas? Por que tem essa necessidade de me falar de tudo?
- Não sei!
- Tem coisas que eu preferia não saber!
- Por que?
- Você fica mais real assim, quando as descubro.
- Você prefere a ilusão que criou de mim?
- Acho que sim...
- Mas eu gostaria de poder mostrar-me, sinto-a mais perto assim e confio em você!

Ela encheu o peito de alegria. Se é por isso, poderia até se sentir feliz ouvindo-o falar de suas antigas aventuras, sempre tão vazias de sentimento e tão intensas de negação, ainda que se roesse de ciúmes! Ele amara mulheres demais, só que nunca havia sentido o amor por inteiro, preferia a ineficiência do amor inventado. Ela temia amar de mais e perder o próprio rumo. Não o queria só pra ela, não como posse de um objeto, mas o queria mais pra ela, próximo o bastante para que se sentisse segura. Ele podia ser tão doce...
Ela apertou o travesseiro contra o peito pra ver se poderia diminuir o vazio... A vitrola tocava uma música antiga e ela cantarolava em pensamentos as promessas feitas: ‘se você vier pro que der e vier comigo... eu te prometo o sol, se hoje o sol sair, ou a chuva se a chuva cair...’ Nunca haviam feito promessas, mas nada maior que dar ao outro aquilo que de melhor a vida lhe oferecia. Pensou nele mais uma vez.... notou que havia caminhado algumas páginas no livro, mas não havia lido nenhuma palavra com o mínimo de atenção. Ligou o telefone, mas não teve coragem de discar. Desde que chegara ele não havia ligado e ela não o faria por ele. Levantou-se pegou seu livro preto e colocou-se a escrever. Havia tanto a dizer que se não o fizesse morreria de agonia. Escreveu até adormecer. E se permitiu sonhar com ele, sem culpa, afinal sonhos ela não controlava!

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